MEMÓRIA DE
SÃO JOÃO DO RIO VERMELHO
Houve um tempo, lá pelos idos de 1960 em que a produção anual de leite chegou a 100 mil litros, sobrava tanto leite que chegou a ser organizada a venda para usina da capital. Em 1968 chegou-se a formar uma cooperativa com 78 sócios, mas por problemas de coleta do leite e dificuldades de transporte a cooperativa passou a ter prejuízo e fechou em 1979.
por José Luiz Sardá
* Parte do texto foi extraído do livro Memória dos Açores em Santa Catarina Autores: João Lupi e Suzana Lupi
O Distrito e a antiga freguesia de São João do Rio Vermelho tem origem no rio que nasce na base dos cômoros de areia que separam a praia, dos terrenos das antigas lavouras deste lugar. As águas do rio Vermelho nascem claras, mas a três quilômetros ao sul da nascente, muda para uma cor avermelhada. Os moradores atribuem à mudança de cor em pela composição do carbureto no solo pantanoso, e na vegetação predominante de aroeiras, razão pela quais as águas do rio e das valas nas redondezas ter tons avermelhados, principalmente nos períodos de chuvas torrenciais. Próximo aos morros no lado oeste, há outro riacho, com menor volume de água, chamado rio do Muquém. Os nomes dos lugares, ruas e servidões guardam as memórias dos moradores antigos e de famílias tradicionais ou de pessoas que lá viveram e fizeram sua história na comunidade.
A região de São João do Rio Vermelho, como todas da Ilha de Santa Catarina, foi povoada por índios Carijós. A exploração arqueológica do lugar foi iniciada pelo jesuíta do Colégio Catarinense, o Padre João Alfredo Rohr (1908-1983). Suas escavações e trabalhos teve ajuda de moradores antigos do lugar, muitos deles já falecidos. Os principais sítios explorados foram os sambaquis do porto do Rio Vermelho e o sambaqui próximo à praia, ambos escavados em 1959.
Os resultados dessas pesquisas e de muitas outras, encontram-se no Museu do Homem do Sambaqui e no Museu de Antropologia da Universidade Federal de Santa Catarina, que conserva um vaso de cerâmica, relíquia descoberta quando se cavava o bebedouro em frente à igreja. As explorações, escavações e estudos ainda são insuficientes para detalhar o povoamento dos índios Carijós em São João do Rio Vermelho. Pouco se sabe sobre as primeiras ocupações portuguesas no leste da Ilha, exceto a ocupação do grupo de Antônio Bicudo Camacho e do seu sobrinho, padre Matheus Leão, que em 1689 se fixou entre a Lagoa da Conceição, Santo Antônio de Lisboa e nas margens do Rio Ratones. Os moradores mais antigos, afirmam que foi Antônio Camacho que colonizou as terras de Rio Vermelho.
Historiadores e moradores mais antigo, afirmam que o povoamento e a história deste lugar, começou na segunda metade do século XVIII, com a vinda dos açorianos a partir de 1748, estabelecendo-se junto à Lagoa, depois rumando para o Norte da Ilha. Mantém-se viva na memória dos nativos os nomes dos primeiros moradores: Senábio (que diziam Sanabo); Manuel Ladislau de Oliveira (o Manel Lalau); o Flor Martins, que morava na Ponta da Quitéria, dono de muitos escravos e de terras, o Manuel Guilherme, entre outras famílias tradicionais: Serrão, Silveira, Nunes, Soares, Vasquez, Manuel Felisbino, além do Padre Antonio de Santa Pulquéria Mendes de Oliveira, primeiro e único pároco residente, que tinha casa ao sul da atual igreja, que foi também senador da República.
As histórias contadas pelos mais velhos e repassadas pelos avós, bisavós e tetra avós, deixam supor que o povoado deve ter começado há mais de dois séculos, com algumas famílias de colonos, donos de engenhos e escravos a partir de 1820. Em princípio, a ocupação deu-se junto à lagoa na parte Sul do atual distrito, e não nas terras baixas, onde localiza-se atualmente o camping e a sede do Parque Florestal, visto que estas terras foram às últimas do distrito a serem ocupadas. As indicações sugerem que o povoado deu-se na direção Sul para o Norte, por moradores que vinham da paróquia da Conceição.
A colonização destas terras motivou a construção de uma pequena igreja: a primeira seria datada de 1750, a segunda por volta de 1810, mas o aumento da população parece ter sido rápido, pois em 1831, por decreto regencial de 11 de agosto, era criado o Distrito e a Paróquia de São João Baptista do Rio Vermelho. Nesta época a população já devia ter avançado ao norte, dado que a igreja atual, que foi reconstruída e ampliada está localizada mais próxima do extremo norte. Naquela época o centro do Distrito estava nas mediações da igreja, sentido às terras de Ingleses e Praia Brava. Ao sul às terras junto à lagoa, que pertenciam à freguesia de Nossa Senhora da Conceição.
Nos morros do lado Oeste em particular no Sertão, num passado distante morou muita gente, e no Macacu ainda se encontra ruínas de chãos de casas. Daquele lado havia no início do século passado três engenhos de açúcar e três de farinha; eram três povoações: a dos morros, a da estrada e a do rio. Hoje em dia todas as residências se concentram ao longo da rodovia João Gualberto Soares que liga à Barra da Lagoa aos Ingleses. Por razões históricas, geográficas e sociais o povoado ainda é dividido pelos nativos em: centrinho, conhecido por “Ilhota”; para o lado norte “lá em cima ou Muquém” e ao sul da “lá de baixo ou Porto”. Na parte dos fundos “Travessão”, antigas e grandes glebas de terras com lavouras de mandioca, milho, feijão entre outras culturas. Nos últimos anos, a especulação imobiliária e o parcelamento do solo, transformou-se em grandes condomínios, loteamentos e extensas servidões.
Por volta de 1930 alguns homens a maioria pescadores artesanais começaram a sair do povoado para trabalhar na pesca embarcada de alto-mar no litoral sudeste de São Paulo ao Rio Grande do Sul, notadamente em Santos e Rio Grande, iniciando assim, o declínio da pequena artesanal na Ilha de Santa Catarina. A partir da década de 1940, os problemas se agravaram com o esgotamento dos solos, seguido pela praga do jervão que afetou a lavoura da mandioca. Em 1968 chegou-se a formar uma cooperativa com 78 sócios, mas por problemas de coleta do leite e dificuldades de transporte à cooperativa passou a ter prejuízo e fechou em 1979. Outro problema foi à diminuição do gado pela doença do morcego, a implantação do parque florestal que ocupou boa parte dos pastos, diminuindo as áreas de pastagens, além dos produtos agrícolas vindos do continente que entraram em concorrência com os cultivados na ilha, originando também o abandono da agricultura no interior da ilha.
Por volta das décadas de 1930 e 1940, as casas e propriedades lindeiras dos morros do lado ocidente começaram a ser abandonadas, e nas décadas de 1950 e 1960 teve início às construções de casas de alvenaria ao longo da estrada principal. Entre os anos 1960 e 1970, houve uma queda considerável no número de habitantes, cerca de 2.000 pessoas, em razão do desmembramento do distrito para o Distrito de Ingleses do Rio Vermelho. Com a divisão geo-política, o limite sul de Rio Vermelho, conhecido como Tijuco (lugar de solo mole, pantanoso), passou para as imediações da Barra da Lagoa, diminuindo consideravelmente a população do lugar.
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