quarta-feira, 24 de janeiro de 2018

NO PARANÁ

Veranistas em praia de Pontal do Sul. Ao fundo Terminal da Techint, cenário que poderá ser ainda pior com a viabilização do Porto de Pontal. Foto: Daiana Lopes

Não se deixe enganar: uma bomba relógio foi lançada sobre o litoral paranaense

Estrada que ligará a PR 407 à Pontal do Sul abre caminho para um Complexo industrial e portuário, que destruirá comunidades, áreas de preservação ambiental e põe em risco o segundo mais importante ponto turístico do estado: a Ilha do Mel.

O governo do estado na última semana anunciou uma série de obras visando melhorias para o litoral paranaense: obras de saneamento em Matinhos e Pontal do Paraná – há muito tempo adiadas – e uma série de ações de mobilidade para “garantir melhor fluidez ao tráfego, que beneficiarão motoristas, ciclistas e pedestres, tanto das cidades com praia quanto da área portuária”, segundo o secretário José Richa Filho.

A declaração do secretário deixa evidente interesses maiores que estão por dentro do anúncio das obras: criar uma agenda positiva de ações no litoral para dissimular interesses empresariais, que representam riscos evidentes ao desenvolvimento econômico, social e ambiental sustentável de Pontal do Paraná – e, por consequência, do litoral do estado como um todo.

Além da construção de um binário de acesso à Pontal do Paraná, foram anunciadas as seguintes obras: Ponte, calçadas e ciclovia em Guaratuba, duplicação da AV JK em Matinhos, acostamentos em Pontal do Paraná, novo viaduto e reforma da Avenida Bento Rocha em Paranaguá – e ali em meio a essas “adequações” que parecem muito bem vindas, está o mega projeto de construção da chamada Faixa de Infraestrutura – um corredor rodoviário, de cerca de 20 km de extensão, que ligará a PR 407 (ligação da BR 277 à Praia de Leste) à zona portuária de Pontal. O edital para licitação da obra deve ser lançado em breve.

Quem ganha com isso?

Um processo de desinformação está claramente sendo desenhado pelo governo do estado para maquiar os verdadeiros beneficiários da obra pública. A história vendida a comerciantes e prefeitos do litoral, e que custará ao estado cerca de R$ 370 milhões, é que a estrada irá beneficiar o turismo e o comércio da região. E foi assim, sob um trâmite questionável e opressivo, amparado por dezenas de comerciantes com camisetas “Estrada Já”, que o Conselho do Litoral (Colit) aprovou o licenciamento prévio da obra em dezembro, mesmo com todas ressalvas apontadas por técnicos do Instituto Ambiental do Paraná (IAP) e os questionamentos de organizações ambientais que compõem o Conselho. 

“É evidente que tal estrada não trará benefício a moradores e turistas da região, uma vez que se tratará de estrada de pista simples, para atender ao grande fluxo de veículos que será gerado pelo Complexo Industrial e Portuário. Projeto que incluirá um terminal de óleo e gás e uma termelétrica, no entorno do terminal já existente da Techint”, alerta Juliano Bueno de Araujo, coordenador de campanhas da 350.org Brasil.

Para alguns poucos comerciantes e moradores de Pontal, que não se deixaram enganar, está claro que a estrada não trará benefícios aos moradores, comerciantes e turistas e atenderá apenas ao porto. “Uma solução séria, que vise nos beneficiar passa pela melhoria de estruturas urbanas já existentes, criar melhores vias internas. Esta estrada a quilômetros daqui, passando por cima da Mata Atlântica, não ajudará aos moradores, que circulam muito entre os balneários”, defende Evelyn Krelling, comerciante de Pontal do sul.

Para a servidora pública Silvana Borges que percorre diariamente a PR 412 e conhece bem os congestionamentos em períodos de temporada, para ir de sua casa em Praia de Leste até o trabalho em Pontal do Sul, a solução para o problema seria bem diferente. “Se eu quero uma nova estrada? Sim, com certeza eu quero. Mas sonho com algo diferente, penso numa orla bem feita, uma acessibilidade garantida de Praia de Leste a Pontal do Sul e não ter de enfrentar uma rodovia com maior percurso e cheia de caminhões”, defende.
PR 412 que liga Praia de Leste à Ponta. A falsa justificativa para construção da nova estrada é desafogar o trânsito entre balneários. Foto: Daiana Lopes

É bem pior do que você pensa

A faixa de infraestrutura terá 175 metros de largura e, embora o governo anuncie num primeiro momento a construção de uma estrada de faixa simples e de um canal de drenagem, o projeto completo inclui a construção de um gasoduto, uma ferrovia e uma linha de transmissão – mais uma evidência de que o projeto visa atender unicamente a interesses do futuro Complexo Portuário. Conforme protocolo de intenções assinado entre Copel, Governo do Estado e a Shell, o projeto prevê a instalação de uma termelétrica a gás, e de um terminal de gás no porto. A empresa Compagás cita, inclusive, em seu Relatório Anual de 2016, no parágrafo “Perspectivas para 2017”, o investimento de aproximadamente R$ 1 milhão para estudos de viabilização do terminal.

“Estamos falando de uma das formas mais retrógradas e caras de produção de energia, que gera poluição atmosférica, consumo excessivo de água e que terá impacto direto sobre o bioma marinho, uma vez que a água utilizada para resfriamento de turbinas será despejada em alta temperatura sobre o mar. E o que dizer sobre um terminal de gás operando em meio a áreas de preservação ambiental? Qualquer acidente pode representar o fim da diversidade e da vocação natural da região”, alerta Nicole Figueiredo de Olivera, diretora da 350.org Brasil.

O projeto irá concluir o processo de violência e expulsão de comunidades tradicionais pesqueiras que ocupam há mais de séculos áreas do entorno – como a Comunidade do Maciel – e acabará com a pesca artesanal, responsável hoje pelo sustento de quase 100 famílias de Pontal do Sul e proximidades. Famílias que hoje ainda vivem nessas comunidades relatam ameaças e pressões diversas para que saiam do local por parte do grupo que planeja o porto. Todas as atividades acontecendo à beira de uma das preciosidades naturais do Paraná, a Ilha do Mel.

Enfim, não haverá porto, termelétrica e terminal de gás sem a polêmica estrada, que é condição para viabilização dos projetos. Estrada esta, que só ela, derrubará 500 hectares de Mata Atlântica preservada, afetará aldeias indígenas da região e um patrimônio natural e histórico de milhares de anos: os únicos sambaquis ainda existentes no estado.

É este o desenvolvimento que queremos para nosso litoral?

Saiba mais sobre os projetos, acompanhado as redes da 350.org Brasil. Junte-se a nós neste movimento. Salve a Ilha, salve pontal… Salve o Litoral!

(Do https://350.org/)

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