Rita Moura/Folhapress |
O pescador João Alves de Amorim, 58, tenta pescar sururu com o uso de redes, sem sucesso
Ganha-pão, sururu desaparece e deixa pescadores sem sustento em Maceió
por KATIA VASCO
Às margens da lagoa Mundaú, em Maceió, uma quadra antes cheia de pessoas vendendo sururu agora está abandonada. Sentada no local, Verônica Alves dos Santos, 47, ainda tenta manter a esperança, mas está apreensiva com o desaparecimento do produto, uma referência da culinária alagoana e bem cultural do Estado.
A diminuição do nível da salinidade da lagoa fez o animal desaparecer, o que deixou 3.000 famílias (cerca de 11 mil pessoas) sem renda.
Mãe de cinco filhos, Verônica diz que aprendeu o ofício com a avó e a mãe e depois ensinou aos filhos. Agora não sabe o que vai fazer se ele não reaparecer. "Sem estudo, quem vive do sururu não sabe fazer outra coisa."
Os pescadores de sururu não recebem o seguro-defeso –espécie de seguro-desemprego pago pelo INSS a pescadores artesanais– porque o molusco não está entre as espécies ameaçadas e, portanto, cobertas pelo benefício.
Antes, a pesca e a venda do sururu chegavam a render R$ 200 por dia às famílias. Para fazer isso, os pescadores mergulhavam até o fundo da lagoa e capturavam o animal com a mão. Em terra ele é lavado, retirado das ostras, limpo e fervido, antes de ser levado ao consumidor.
Presente em praticamente todos os Estados do Nordeste e no Espírito Santo, o sururu é um molusco bivalve (inserido entre duas conchas) que precisa de um teor de salinidade entre 12 ppm (partes por mil) e 30 ppm para sobreviver. Na lagoa Mundaú esse teor chegou a zero devido ao grande volume de água doce.
O excesso de chuvas nos últimos dois meses é apontado como a principal causa do desaparecimento do sururu nas lagoas Mundaú e Manguaba, também na região metropolitana. Somente nos meses de maio e junho choveu em média 83% do esperado para todo o ano, segundo a Defesa Civil de Maceió. A lagoa da cidade de Roteiro (a 60 km da capital) também foi afetada.
Até agora o problema está restrito a Alagoas, não há casos no restante do Nordeste.
Com o sumiço do animal, apenas os pescadores que possuem rede ainda conseguem capturar alguns tipos de peixes, como bagre e tainha –que rendem entre R$ 10 e R$ 50 por dia.
O pescador João Alves de Amorim, 58, diz que, mesmo com as redes, não está conseguindo nada. Por isso o barco passa mais tempo ancorado do que navegando.
A maior parte das famílias está sobrevivendo da reciclagem do lixo e de doações. Alguns buscaram as colônias de pescadores atrás de bicos, como pedreiro e pintor.
O casal Jaciara Luciano dos Santos, 48, e Washington Diniz Machado, 60, sobrevive dessas doações para completar a renda da pesca bagre.
O governo estadual não tem um plano imediato para evitar a extinção do molusco, diz o coordenador de Gerenciamento Costeiro do IMA (Instituto do Meio Ambiente), Ricardo César. Segundo ele, estão sendo feitos estudos para criar um plano de ação.
Ele defende que a solução é uma dragagem para a entrada da água do mar no leito do rio, aumentado da salinidade. A última vez que uma draga abriu o caminho do mar para a lagoa foi na década de 1990.
O sururu é um molusco bivalve (inserido entre duas conchas) que precisa de um teor de salinidade entre 12 ppm (partes por mil) e 30 ppm para sobreviver
DESAPARECIMENTO
O biólogo e consultor ambiental Álvaro Borba Júnior, afirma que a possibilidade de desaparecimento em definitivo do sururu é real.
Segundo ele, não basta apenas a dragagem, é preciso aumentar a profundidade das lagoas e fazer uma recuperação da mata ciliar dos rios. "Houve uma degradação sistemática das lagunas, principalmente da Mundaú, que banha a capital e que sofre com o crescimento da cidade."
Além das chuvas e do assoreamento, a poluição, causada sobretudo por ligações clandestinas de esgoto e o acúmulo de lixo, influenciam na baixa produção e na qualidade do molusco na laguna.
O IMA diz acreditar que o problema de salinidade só deva ser contornado entre setembro e outubro. Os pescadores dizem que isso só deve ocorrer no final do ano.
A Federação dos Pescadores de Alagoas afirma que pediu aos governos estadual e municipal a distribuição de cestas básicas emergenciais, sem receber respostas.
A Secretaria Municipal de Assistência Social afirmou que não recebeu o pedido.
O governo estadual disse que está buscando uma forma de ajudar os pescadores, mas que ainda não tem previsão se isso será feito.
(Da http://m.folha.uol.com.br/)
Nenhum comentário:
Postar um comentário