quarta-feira, 26 de julho de 2017

A LENDA DAS 300 MIL TAINHAS

Seu Orlando ouvia a história quando era criança Foto: Cristiano Estrela / Agencia RBS

Pescadores contam história de lanço de 300 mil tainhas cem anos atrás no norte da Ilha
Relato que teria ocorrido na Lagoinha atravessou gerações e teria começado com uma "praga" de bruxa. Duvida?

Caroline Stinghen
caroline.stinghen@horasc.com.br

Quem é morador antigo da Lagoinha, em Florianópolis, com certeza já ouviu um causo que passou de pai para filho, para neto e agora para bisneto. Uma história de fartura, que acabou em nada. Há cerca de 100 anos, lá pelos idos de 1915, acreditam os pescadores do rancho da Lagoinha, uma lanço de 300 mil tainhas abrilhantou a praia. A triste ironia é que, para aquela época, era muito peixe para pouca gente.

A mesma história é contada por vários pescadores, mas ela é mais fresquinha na mente do aposentado e ex-pescador Orlando Maximiliano da Silva, de 86 anos, que até hoje mora ao lado do rancho da Lagoinha, próximo à praia.

— Eu ainda não era nascido, mas meu pai contava que um dia uma mulher apareceu aqui na Lagoinha pedindo uma tainha. E ninguém quis dar para ela o peixe. Então ela jogou uma praga: disse que ia dar tanta tainha que eles não saberiam o que fazer com elas — contou o aposentado.

Ninguém sabe ao certo que ano que isso ocorreu, e nem o dia do lanço, mas as prateadas apareceram, cumprindo a profecia. No dia, conta Orlando, os pescadores estavam carneando um boi — já que a safra da tainha estava ruim — para alimentar a comunidade, quando o vigia começou a apitar.

— Todos saíram correndo, deixando o boi morto para trás. Pegaram as canoas e entraram no mar. Eles tinham redes muito pequenas, mas nem precisava. Meu pai dizia que as tainhas estavam vindo sozinhas em direção à praia — continuou o aposentado.

O avô de Nézio também contava a históriaFoto: Cristiano Estrela / Agencia RBS

Já o pescador Nézio ouviu de seu avô que os peixes eram tantos que pulavam sozinhos no costão, e que eles podiam recolher as tainhas de balaio, em terra firme.

— Foram 300 mil tainhas contadas, dizia o meu pai. O problema é que não tinha o que fazer com elas. Não tinha estrada, não tinha energia elétrica. Apenas um homem que tinha uma embarcação conseguiu levar uma parte para vender na Armação. Mas mesmo assim, sobrou muito. Arrancaram as ovas das tainhas e enterraram todas elas na praia — relembra Orlando.

Nézio também conta que o cheiro ruim de peixe morto, como lhe contara seu avô, durou muitos dias na praia. E que, por muito tempo, o óleo dos peixes se soltava na areia.

A mulher que jogou a praga — muitos acreditam que se tratava de uma bruxa — nunca mais foi vista pela região. E o boi que estava sendo carneado, quando os pescadores voltaram, já não estava mais lá. Alguém levou.

Foto Cristiano Estrela / Agencia RBS

Desde então, nunca mais houve um lanço tão grande na região. O próximo recorde veio somente em 2011, quando as 33 mil tainhas foram cercadas já pela equipe de Nézio.

— Meu pai sempre contou que os lanços da época dele não eram muito grandes. Tanto que eles dividiam a tainha entre eles em postas, e nunca com peixe inteiro — relatou o trabalhador.

— Eu gostaria muito de ver um lanço de 300 mil tainhas ainda. Queria muito que isso ocorresse de novo. Mas acho que daí não seria mais necessário enterrá-las. O máximo que ia acontecer é tainha de graça e na mesa de todo mundo — brincou ainda o aposentado Orlando. 

(Do http://horadesantacatarina.clicrbs.com.br/)

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