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Pesca está autorizada desde o dia 1° de maio - Daniel Queiroz/ND
Pesca da tainha: a organização dos pescadores artesanais para não perder os lanços
Cada pescador tem uma função específica e quando o aviso chega pelo rádio, todos saem correndo para puxar o lanço do mar
por MICHAEL GONÇALVES, FLORIANÓPOLIS
Mesmo sem a condição climática adequada, as tainhas começam a aparecer discretamente na Ilha de Santa Catarina, em Florianópolis. Nos três primeiros dias da safra de 2017, que começou em 1° de maio, foram capturadas 761 tainhas em três praias: Ingleses, Brava e Barra da Lagoa. Em busca de águas mais quentes, elas sobem o litoral brasileiro a partir do mês de maio. Aos 72 anos, o pescador Adir João Lemos, o Diquinho, ainda se emociona com o pescado e aproveitou a sua primeira captura do ano nesta quarta-feira (3) para se deliciar com as postas fritas. Enquanto elas não chegam em abundância, os pescadores se organizam como em uma empresa e cada um realiza uma atividade.
Somente na praia da Lagoinha, no Norte da Ilha, são quatro olheiros que observam a chegada das tainhas. Eles ficam divididos nos costões e realizam o monitoramento desde a praia Brava. Um deles é o pescador Amilton Manoel Raimundo de Souto, 47 anos, que aprendeu o ofício com o pai aos 10 anos de idade.
Enquanto os outros pescadores estão com o pé na areia e com o sol no rosto, Amilton fica sob a sombra de uma figueira. “Meu material de trabalho é o rádio comunicador e o apito. O olheiro precisa estar atento ao movimento do mar e aos cardumes. Com o tempo, a gente consegue diferenciar o tipo de peixe pelo movimento da água”, conta.
Amilton começa o expediente, às 6h, e só abandona o posto para almoçar. Segundo o olheiro, a praia da Lagoinha registra grandes lanços no período noturno. “Teve um dia que trabalhei a madrugada inteira e no dia seguinte estava exausto. Por conta disso acabei cochilando e perdi um lanço com 12 mil tainhas”, lamenta.
O pescador aposta em uma boa safra nesta temporada. “Quando tem maré alta na Sexta-feira Santa, flor no espinho e o frio no outono são sinônimos de tainha”, brincou Amilton, que citou as ditos populares.
Remeiros precisam ser rápidos para formarem o cerco
As embarcações da pesca artesanal sem motor têm seis tripulantes normalmente. São quatro remeiros, um bucheiro e o patrão. Na Barra da Lagoa, a pesca é feita com apenas uma embarcação e, por isso, o sétimo tripulante é o nadador, que ajuda a fechar o cerco.
Após o aviso do olheiro, a canoa leva em média 30 minutos para chegar até o local do cardume e soltar a rede. “Assim que o aviso chega pelo rádio, a gente sai correndo para o barco. Você pode estar almoçando, que é preciso sair do mesmo jeito. Para fazer tudo o mais rápido possível, os remeiros têm que ter muita disposição e força. Já passei por perrengues e fraturei um dedo quando uma canoa virou”, lembra o remeiro Ernani Vieira, 58, da Barra da Lagoa.
Ernani é parceiro do livreteiro Armando Machado, 58, que é aposentado da Celesc. Casado com a filha de um pescador, Armando ganhou a função de organizar as contas da Associação Saragaço. “Meu trabalho é o de não deixar faltar nada no rancho e fazer o controle da venda das tainhas. As 51 capturadas nesta quarta (3) ficaram para a nossa associação, porque não compensa vender”, explicou.
Lanços com tamanhos diferentes de tainhas
Na praia de Ingleses, o pescador Arnaldo Tomaz dos Santos, 73, o Naldo, olha para o mar na esperança de ver um lanço de tainha. Ele ainda não conseguiu colocar a sua embarcação na água, que está pronta para a captura. Em 2016, ele pegou 1,5 tonelada do pescado. “A tainha é igual a uma moça bonita. Quando ela chega quer se exibir e fica pulando. Os lanços até agora foram pequenos e de tamanhos variados“, contou.
A situação na Praia Brava não é diferente. Os pescadores também pegaram tainhas nos dois primeiros dias desta temporada, mas de tamanhos variados. “Aqui a tainha aparece em quantidade e no tamanho ideal a partir de 15 de maio. Por enquanto, elas vêm misturadas. Pelo menos não temos incomodação com os surfistas. Agora, a gente precisa esperar pelo vento sul, porque o Nordeste não serve”, desabafou o pescador Carlos Roberto Bernando, 49, o Carlinhos.
Saiba mais
A tainha se alimenta principalmente de detritos orgânicos e algas presentes sobre os fundos de estuários e lagoas costeiras, que são áreas de proteção, alimentação e crescimento;
Quando ultrapassa cerca de cinco anos de idade e o tamanho de 40 cm, a tainha está apta para a primeira migração reprodutiva em mar aberto. A migração reprodutiva ocorre em áreas costeiras nos meses de outono e de inverno, de forma associada à intensificação e passagem de frentes frias;
Após a desova em mar aberto, as tainhas adultas retornam para os estuários e lagoas costeiras, onde passam a maior parte do ano até a próxima migração;
As larvas são planctônicas (derivam à mercê das correntes marinhas). Após cerca de dois meses de estágio larval, os pré-juvenis (menores que um cm) agregam-se na zona de arrebentação das praias próximas às desembocaduras dos estuários, aguardando condições climáticas e oceanográficas favoráveis para entrada nos estuários;
A tainha vive em média 10,5 anos e pode atingir cerca de 1 m de comprimento.
Fonte: Ministério do Meio Ambiente
Glossário da pesca
Patrão – É o dono das redes e das embarcações. Precisa coordenar os outros pescadores e divide as funções;
Olheiro – São fundamentais na pesca da tainha artesanal. Ficam em costões ou em locais mais altos observando a chegada dos cardumes. Antes, eles se utilizavam de apitos e camisetas para sinalizar, mas trabalham com rádios comunicadores;
Remeiros – São os remadores das embarcações. Normalmente, uma canoa tem quatro remeiros. São os pescadores mais fortes, que precisam ter coordenação motora e muita disposição;
Bucheiros – Também trabalham embarcados e a sua principal função é a de colocar a rede no mar. São responsáveis em montar o cerco aos cardumes;
Livreteiro – São os pescadores responsáveis pelas anotações das capturas e dos gastos. É um tipo de tesoureiro da pesca. Cuida da contabilidade.
Temporadas de pesca escalonadas por modalidade
- de 1º de maio a 31 de dezembro para pescarias artesanais de pequena escala (embarcação sem motor e de praia);
- de 15 de maio a 31 de julho para a pesca artesanal de média escala (emalhe)
- de 1º de junho a 31 de julho para a pesca industrial, de grande escala (cerco).
Fonte: Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento
Capturas por unidade de 1º a 3 de maio
Ingleses - 250
Brava - 460
Barra da Lagoa - 51
(Do https://ndonline.com.br)
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