A última “Rainha”
Nasceu na beira da praia e passou a infância dentro de um estaleiro de baleeiras. Desde cedo aprendeu a apontar pregos de cobre imitando o Tio Cyde, “ajudou" a pintar as obras de arte que o Mestre Alécio produzia (não entendia o motivo de colaborar somente na primeira demão) e carregava um cheiro de serragem e cavaco entranhados na alma. Acompanhar o processo de construção, passo a passo, aos olhos do franzino manezinho, parecia algo mágico. Em questão de dias, o tronco de peroba entalhada se transformava em quilha. A seguir, proa e popa erguiam-se altivas. Então, o verdugo passado entre uma e outra, dependendo do projeto desejado, mais cargueira ou veloz... Vê-la tomar forma, o cavername alinhado – que lembrava as costelas de uma baleia de verdade – simplesmente o encantava. Depois era arcar, calafetar, pregar, repuxar e colocar massa em todas as tábuas do costado. Por fim, o interior; bancos, forro e paneiros, instalação do motor e... Mais uma Rainha ganhava as águas tranquilas da baia sul, navegando majestosa rumo ao horizonte.
Infelizmente, apesar de toda admiração e orgulho, o menino não aprendeu a técnica consagrada pelos seus antepassados. Seu pai acreditava que ser carpinteiro naval não lhe traria um futuro promissor e preferia que estudasse para ser “Doutor” em Direito, Medicina ou Engenharia. Quem sabe, enxergava faltarem talento e determinação ao aprendiz. Talvez o advento das lanchas de fibra e barcos de alumínio, o encarecimento da matéria prima e a falta de valorização do trabalho artesanal também tenham sido decisivos para que ele assim pensasse. O fato é que, depois de quase cem anos, o estaleiro não fabrica mais o sonho de todo pescador. Produz ostras... Mas essa, já é outra história...
Em dezembro comemoramos o octagésimo sexto aniversário do último Panda do Ribeirão. Então, nesse mês o texto no Jornal Ladosul foi em homenagem ao velhinho. Felicidades mô quirido! Um bjão no coração mô sagrado! Te amo mais que tudo cara!!!
• Esta é a última embarcação produzida pelo meu ídolo, Seu Alécio Heidenreich. Foi adquirida pelo navegador Amyr Klink e doada ao Museu Nacional do Mar em São Francisco do Sul. Encontra-se exposta no Salão das Baleeiras.
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