Foto Diorgenes Pandini / Agencia RBS
Morte de 11 trabalhadores em 30 dias faz Ministério do Trabalho apertar fiscalização sobre a pesca
por Dagmara Spautz
Há duas décadas não se registrava um número tão grande de óbitos
por Dagmara Spautz
A morte do pescador Linaldo Galdino de Brito, 32 anos, vítima de uma mordida de tubarão na costa do Rio Grande do Sul semana passada, elevou para 11 o número de trabalhadores que morreram durante o trabalho em embarcações de pesca catarinenses nos últimos 30 dias. Os casos acenderam o alerta no Ministério do Trabalho (MTE)e poderão mudar o modelo de atuação sobre o setor pesqueiro. A partir de janeiro, a Coordenadoria de Trabalho Aquaviário e Portuário da pasta, hoje mais concentrada nos portos, vai apertar a fiscalização sobre a pesca em Santa Catarina.
— Itajaí, com a maior frota pesqueira do país, tem em torno de 300 barcos. É uma população de trabalhadores pequena para essa quantidade de mortes — diz Alexandre Stefano Paranzini, que coordena a fiscalização do setor no Estado.
Segundo dados do Sindicato dos Trabalhadores nas Empresas de Pesca de Santa Catarina (Sitrapesca), há pelo menos duas décadas não se registrava uma quantidade tão grande de mortes em curto espaço de tempo. Agrava a situação o fato de que nove das 11 mortes tenham sido provocadas por naufrágios: um em Imbituba, no dia 20 de outubro, outro em São Francisco do Sul, no dia 26. Inquéritos instaurados pela Marinha, ainda sem prazo de conclusão, dirão se esses acidentes poderiam ter sido evitados.
As condições de mar nos últimos meses foram atípicas, consequência do El Niño, com grandes ressacas nas últimas semanas. A pergunta que terá que ser respondida pela investigação é se todos os pré-requisitos de segurança foram aplicados.
Classificada pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) como uma das profissões mais perigosas do planeta, com alto risco de acidentes, a pesca oceânica tem uma longa lista de problemas. Os mais fáceis de detectar são os altos índices de informalidade, estimados em mais de 80% no país, segundo a própria OIT, e a falta de formação adequada. É nas viagens para alto-mar, entretanto, que estão os maiores riscos à saúde do trabalhador. De acordo com o Ministério do Trabalho, as irregularidades vão desde barcos com falta de espaço para descanso adequado nas embarcações, até a exposição a gases de motor ou a instalações elétricas precárias.
O MTE não informou quantas multas foram aplicadas à pesca nos últimos meses, mas o setor está entre os que mais recebem autuações apesar do pequeno contingente de fiscais: apenas quatro para atividades portuárias e aquaviárias em todo o Estado.
— Encontramos em Santa Catarina barcos que nem vaso sanitário têm. Estranhamos que isso exista ainda, e a percepção do pescador é de que isso faz parte do cotidiano. Isso deixa a fiscalização atônita. O pescador ainda não entende que é um trabalhador com os mesmos direitos dos demais – afirma Paranzini.
Procurador do Ministério Público do Trabalho em Santa Catarina (MPT), Anestor Mezzomo, representante suplente da Coordenadoria Nacional do Trabalho Portuário e Aquaviário (Conatpa), ressalta que as fiscalizações exigem uma logística de parceria, com o apoio da Capitania dos Portos, Polícia Federal, Marinha e Ministério do Trabalho, já que os flagrantes só podem ser feitos em alto-mar, o que dificulta as ações. Mas há possibilidade de identificar irregularidades mesmo à distância. O MPT mantém em sua página na internet um espaço para denúncias, que podem ser feitas anonimamente.
— Santa Catarina tem o maior parque pesqueiro do Brasil, bem como o maior parque industrial de beneficiamento de pescado, onde há muitas irregularidades que também vêm sendo combatidas.
OS ACIDENTES FATAIS
20 de outubro: 7 mortos
O barco atuneiro Jorge Seif Junior, de Itajaí com 24 a bordo, naufragou a 80 quilômetros da costa de Imbituba. Um navio mercante passava pelo local e ajudou no resgate de tripulantes. Um pescador foi encontrado morto. No dia 1º de novembro a Marinha interrompeu as buscas por desaparecidos e declaradou mais seis mortos.
26 de outubro: 2 mortos
Barco com cinco tripulantes que seguia para Cananeia (SP) naufragou em São Francisco do Sul. O naufrágio ocorreu na Prainha. Três pescadores se salvaram. Dias depois, dois corpos foram localizados.
Primeira semana de novembro: 1 morto
De acordo com o Sitrapesca, um pescador de Navegantes que estava a bordo de um barco registrado em Florianópolis morreu após bater a cabeça durante uma operação de cerco – modalidade de pesca que captura sardinhas e tainhas.
15 de novembro: 1 morto
Pescador, a bordo da embarcação Alemão Pescados, de Itajaí, morre após ser mordido por um tubarão a 180 milhas da costa, no Rio Grande do Sul. O trabalhador morreu em decorrência do sangramento.
Enquanto isso...
(Do http://osoldiario.clicrbs.com.br/)
Sindicato diz que segurança é adequada e cobra agilidade no socorro
Diferente do Ministério do Trabalho, Sitrapesca afirma que não há problemas graves
A percepção dos problemas de saúde e segurança do trabalhador na pesca, identificados pelo Ministério do Trabalho, diverge do posicionamento do sindicato dos trabalhadores em relação ao assunto. Eros Aristeu Martins, presidente do Sitrapesca, afirma que com exceção de espaços pequenos para dormir em barcos mais antigos, não há problemas graves no setor.
— Foi feito vistoria, pedido adequação, mas em algumas embarcações não tem como mexer. Só se tirar o barco da modalidade de pesca.
O Sitrapesca cobra dos armadores (os donos dos barcos) a reposição dos equipamentos de proteção individual, como botas de borracha e roupas impermeáveis, a cada seis meses.
— Em relação à segurança está tudo 100%. Tratamos esses acidentes como uma fatalidade — afirma.
Entretanto, o sindicato tem ressalvas em relação à atuação do socorro e cobra um sistema mais eficiente. No caso de Linaldo Galdino de Brito, vítima da mordida de tubarão, quando os médicos da Força Aérea Brasileira chegaram até a embarcação, que estava a 180 milhas da costa do Rio Grande do Sul, já era tarde.
O Sitrapesca defende que os estados tenham lanchas de alta velocidade, que funcionem como ambulâncias. Entretanto, o delegado da Capitania dos Portos de Itajaí, capitão-de-fragata Alekson Porto, afirma que não haveria embarcação com propulsão suficiente para chegar à área onde estava o pescador ferido em poucos minutos.
No sábado, o corpo de Linaldo foi velado pelos amigos em Itajaí. Segue hoje de avião até Cabedelo, na Paraíba, onde será enterrado. No velório, um dos colegas, que não quis ter o nome divulgado, falou sobre o acidente. Disse que a tripulação voltou "apavorada". Ele mesmo disse que foi mordido por tubarões, mas sem ferimentos graves.
(Do http://osoldiario.clicrbs.com.br/)
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