Desconto concedido pela União afeta cerca de 500 embarcações, quase a totalidade da frota industrial catarinense
Foto: Lucas Correia / Agencia RBS
Sem subsídio para o óleo diesel, pesca industrial de SC perde R$ 7,5 milhões no primeiro trimestre
Estado ficou de fora da regularização da subvenção do combustível, um reflexo da Operação Enredados, da Polícia Federal
Victor Pereira
victor.pereira@diariocatarinense.com.br
Maior polo pesqueiro do país, Santa Catarina amargou pelo menos R$ 7,5 milhões em prejuízos neste trimestre na pesca industrial. A causa está na falta do subsídio do governo federal para o abastecimento das embarcações com óleo diesel, por conta de um efeito colateral da Operação Enredados, da Polícia Federal.
A ação investigou irregularidades na pesca industrial do país e teve o Estado como maior foco de apreensões. Com isso, toda a documentação dos sindicatos ficou retida até que a situação fosse solucionada. O resultado é que os registros que seriam entregues ao governo federal para renovar a subvenção do combustível, um subsídio fundamental para a sobrevivência do setor, não chegaram a tempo de entrar na portaria de regulamentação para 2016. E além do déficit financeiro, SC também perde competitividade no mercado. Isso porque, entre os outros Estados, apenas o Rio Grande do Sul ficou de fora da regularização, também por ter tido volume significativo de papéis recolhidos pela PF.
A subvenção existe desde 2004 e todas as embarcações, industriais ou artesanais, podem ser beneficiadas. A pesca industrial, porém, responde por 95% dos barcos deste contexto, por conta das características da atividade. O benefício reúne duas facilidades: uma é a equalização do óleo diesel com preços internacionais, fornecida pela União. A outra vem do governo estadual, com isenção do ICMS, mas que só é possível quando a publicação da portaria nacional inclui o Estado. O desconto final pode chegar a até 30% e afeta cerca de 500 embarcações – quase a totalidade da frota industrial catarinense.
– Sem a subvenção, ficamos menos competitivos em relação a outras embarcações do país. A questão é que acabamos tendo que praticar o mesmo preço de outros para continuar no mercado, mas isso diminui nossos resultados a ponto de tornar inviável para alguns – desabafa o armador Luís Anderson da Costa, de Itajaí.
No ramo desde 2006, Costa tem uma embarcação e trabalha com 18 pescadores. Ele acredita que se o problema não for resolvido logo, a continuidade desse tipo de pesca está ameaçada:
– Ainda não há muitos armadores e pescadores parando porque é um problema relativamente novo, mas não tem como se sustentar. Impacta toda a cadeia, inclusive aumentando a possibilidade de desemprego.
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Estado aguarda nova portaria do Ministério da Agricultura
Foi publicada oficialmente apenas na última sexta-feira a incorporação das demandas do ex-ministério da Pesca ao Ministério da Agricultura. A expectativa, compartilhada pelas próprias equipes técnicas do ministério, é de que a partir de agora os processos andem mais rapidamente. A PF já devolveu os documentos relacionados à subvenção para o Ministério da Agricultura, que informou que já concluiu as análises e aguarda pronunciamento da procuradoria jurídica para uma nova portaria. Porém, ainda não há data definida para a publicação.
– Na época até encaminhamos cópias dos documentos, mas também em função de toda a desarticulação que houve com a transição do ministério da Pesca para o da Agricultura, não houve retorno. O insumo do óleo diesel é um dos mais caros e a falta do subsídio torna nossos produto mais caro que o de outros Estados. É uma situação grave, porque a subvenção é uma forma de diminuir os impactos das importações fracionadas de outros países, o que acarreta ainda mais prejuízos – explica o oceanógrafo e coordenador técnico do Sindicato dos Armadores e da Indústria da Pesca de Itajaí e Região (Sindipi), Marco Bailon.
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Setor pesqueiro já fala em reflexo no preço ao consumidor
A confusa transição entre os ministérios da Pesca e da Agricultura também é apontada como central para os problemas que o setor enfrenta. O Sindipi, por exemplo, diz que o cenário é reflexo de decisões equivocadas do governo federal quanto aos ministérios. O coordenador técnico Marco Bailon indica outro impasse paralelo ao subsídio do óleo diesel, que é a renovação das autorizações de pesca. O vencimento das licenças varia conforme a modalidade e alguns casos exigem mais urgência, como a pesca da tainha em maio.
– Não houve transição, houve impacto com a redução de equipes técnicas para análise de processos e outras atividades. Grande parte da frota de SC e de todo o país corre o risco de sofrer fiscalização e não ter o documento porque o Ministério da Agricultura ainda não está avaliando os pedidos de renovação – destaca.
A argumentação é semelhante a do mestre em Oceanografia Biológica e doutor em Ciências Paulo Ricardo Schwingel. Para ele, tanto a questão do combustível quando a da renovação das autorizações estão emperradas por dificuldades administrativas:
– Sem o subsídio do óleo diesel a tendência é de que o custo final para o consumidor seja mais alto e isso afeta toda a cadeia produtiva. Existia um Ministério da Pesca. Agora, a Agricultura pegou o filho, mas não está criando. É um problema seríssimo de governança, que pode atingir os setores mais primários e vai chegar às prateleiras.
O empresariado da pesca também aguarda uma definição rápida ao impasse. Diretor-executivo de uma empresa em Itajaí, Dario Vitali diz que já percebe o repasse do prejuízo em toda a cadeia produtiva e consumidora.
– Na indústria, isso se reflete no aumento de preços da matéria-prima. O armador repassa o custo adicional ao preço final do peixe, e isso torna o produto menos competitivo. E sabemos que, mesmo após o impasse do combustível terminar, o mercado demora a se estabilizar, ainda mais com a crise – comenta.
Armador há 36 anos, dono de quatro barcos e presidente do Sindicato da Indústria da Pesca, dos Armadores e da Aquicultura da Grande Florianópolis e Sul Catarinense (Sinpescasul), Konstantinos Meintanis, o Grego, também avalia que o panorama precisa mudar logo, sob risco dos danos serem irreversíveis para alguns armadores.
– A equalização com o preço internacional do diesel permite brigar de igual pra igual com o mundo inteiro. Se persistir, isso é uma ameaça à pesca industrial como um todo – ressalta.
No ramo da pesca industrial desde 2006, Luís teme o desemprego: "Impacta toda a cadeia"
Foto: Lucas Correia / Agencia RBS
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