quinta-feira, 13 de novembro de 2014

MANEMÓRIAS - MEMÓRIA DE RATONES


NOS TEMPOS DE VIRGÍLIO VÁRZEA

por José Luiz Sardá

No livro, A Ilha de Santa Catarina, o autor Virgílio Várzea, cita que a denominação de Ratones tem origem nas duas ilhas situadas em frente ao pequeno estuário do rio Ratones, quase em meio à baía do norte, entre o Pontal e Anhatomirim; e que o povoado dos Ratones eleva-se na várzea banhada pelo rio do mesmo nome, pelo maior dos braços desse rio, dividindo-se em dois logo acima da foz, tomando o braço menor para o norte direito às terras de Canavieiras.

Segundo Várzea, foram os navegantes espanhóis os primeiros que aportaram na Ilha de Santa Catarina e ao avistarem essas ilhas, deram-lhes o nome de Ratones, pela singular semelhança de ambos com os animais dessa espécie de roedores e como eram dois, para distingui-las, passaram a chamá-los Raton Grande e Raton Pequeno, denominação que se conserva até hoje, bem como a designação geral de Ratones.

Este arraial expandia-se ao longo da estrada Real, pela falda-sul do morro da Várzea Pequena ou Várzea de Baixo e uma e outra margem do rio, cujas nascentes demoram à espalda setentrional do Moquém, monte de 390 metros de altura, que separa esta baixada dos planos do Saco Grande e para oeste, indo ramificar-se em Santo Antônio, em pequenas colinas e morros.

Cita ainda, que pelo Moquém sobe um atalho, empinado e em tempo de chuva o acesso era dificílimo, mas valia pena andar por este caminho, pois encurtava consideravelmente a distância entre Ratones e a cidade de Desterro, poupando três quartos de hora da volta por Santo Antônio.

Esse atalho atravessava um dos pontos mais altos do monte, entre imensa floresta secular de mata cerrada e sombria, com perigoso desfiladeiro e que provocava desastres, principalmente nos trajetos noturnos. Apesar disso, este era o caminho preferido pela gente de todas as freguesias e arraiais desse lado da Ilha, que viajavam continuamente por terra entre os arraiais e a cidade.

Na freguesia de Ratones observava-se o avultado negócio de galinhas e ovos, bem como o embarque de farinha, milho, cana e café e o movimento contínuo de pequenas embarcações no rio Ratones, como: lanchões, canoas e botes, e também de pombeiros da cidade, que percorriam todo o sítio, pelas voltas fundas nos meandros do rio Ratones em viagens de comércio.

Havia um local sobre uma das voltas do rio chamado Piçarras onde existiu uma ponte de madeira, (atual ponte de concreto em péssima condição de uso situada na antiga rodovia Virgílio Várzea paralela a atual ponte sobre a SC 401) por onde passava uma antiga estrada reconstruída, que vem da Várzea de Baixo em direção a Santo Antônio, atalhando quase uma hora a enorme curva existente entre a primeira localidade e a última, pela velha estrada Real.

O rio Ratones era por sua profundidade e largura, muito mais acessível a embarcações de pequeno porte que o rio Papaquara em Canavieiras, este sim, com maior movimento fluvial. A vegetação que flanqueava era como no outro braço, composta em sua maior parte de mangais, alternados em alguns pontos por barrancas elevadas onde se vêem pastagens e macegais de arbustos. Havia o Poço das Pedras, assim designado por pescadores nativos, por ser um dos sítios mais fundos do rio e pelo agrupamento de rochas que toma aí uma das margens, onde navegavam canoas de voga, batelões, botes e lanchões de 15 a 20 toneladas, todos em contínuas viagens de comércio entre Desterro e este arraial.

SÉCULO PASSADO

O Distrito de Ratones foi criado em 21 de agosto de 1934 por decreto estadual, quando foi desmembrado do distrito de Santo Antônio de Lisboa. Desde sua fundação a Igreja Nossa Senhora dos Remédios faz parte da história deste lugar.

A vida dos nativos, a labuta e o desenvolvimento desta comunidade deu-se pelos meandros dos Rios Ratones e Papaquara. Naquela época eram grandes as plantações de café e de cana, vendas e armazéns de secos e molhados, criação de galinhas e ovos e intensa pesca. O comércio era forte em função do trafego de mercadorias de todos os gêneros que vinham de vários arraiais da região e eram escoadas no leito destes rios até a cidade de Desterro.

Entre 1949 e 1959 com o objetivo de sanear a Bacia do Rio Ratones, o extinto Departamento Nacional de Obras e Saneamento (DNOS) elaborou e executou projetos de recuperação, aberturas de canais e de valas de drenagens. Em 1978 foram construídas duas comportas sobre o canal deste rio, que modificou bastante a drenagem natural das áreas de planície. Em período de chuva forte, provocava transbordamento do leito do rio, cobrindo de água estradas e casas. Com a operação das comportas o manguezal começou a morrer pela falta de água salgada e o rio sofreu um acelerado acúmulo de matéria orgânica.

No período de 1948 e 1962, segundo relatório do extinto DNOS, o propósito do saneamento das várzeas localizadas na bacia de Ratones permitiria a utilização das terras para obtenção de pastagens artificiais. A ideia era beneficiar os distritos de Ratones e de Canasvieiras para instalação de granjas de gado leiteiro e a fixação de colonos holandeses na Ilha de Santa Catarina. Por essa razão, foi construído um dique no ponto mais estrangulado da bacia, que impediria a entrada de água salgada e a recuperação da região que sofria a influência das marés.

Este dique serviu futuramente como base para a construção da SC 402. A construção fechou o leito original do rio, nos locais conhecidos pelos pescadores como Coroa do Bicudo e Poço das Pedras, sendo considerado pelos pescadores mais antigos, a maior área, melhor ponto pesqueiro e mais profundo do Rio Ratones. Naquela época os pescadores praticavam a pesca artesanal para o sustento de suas famílias e utilizavam o rio como meio de transporte de suas produções.

A partir de 1978 o assoreamento do rio reduziu gradativamente a capacidade de vazão, ocasionando alagamentos sazonais em toda extensão. Durante a maré baixa em alguns trechos não é possível à navegação e na preamar apresenta profundidade inferior a um metro. Em 1980 moradores e pescadores destruíram parcialmente as comportas, permitindo que o fluxo das marés novamente voltasse a influenciar sobre estas áreas dando vida ao manguezal.

Nenhum comentário: