Pesca artesanal preserva cultura de Florianópolis há várias gerações
Segundo Epagri, cerca de três mil famílias vivem da atividade na capital.
Reportagem é a primeira de série do G1 que marca o aniversário da cidade.
Uma atividade passada de pai para filho e que representa parte da cultura e história da capital catarinense. Em 2013, quando Florianópolis completa 287 anos de fundação, a pesca artesanal continua sendo um dos principais estandartes da cultura e tradição açorianas mantidas ao longo das décadas, por dezenas de famílias que tiram do mar o sustento de seus lares. Entre esta quarta-feira (20) e sábado (23), quando a capital faz aniversário, o G1 apresentará reportagens sobre algumas das principais atividades econômicas da cidade. Nesta primeira, traz o ofício herdado dos primeiros habitantes do município.
De acordo com dados da Epagri, a pesca artesanal é a principal fonte de sustento de quase 3 mil famílias da capital catarinense. "Pescador artesanal é aquele que faz a própria rede, que conserta o próprio barco e que aprende desde cedo esta profissão", sintetiza o pescador Silvano Vieira, de 40 anos.
Enquanto conserta a rede de pesca, Amarildo Raimundo Vieira, de 50 anos, recorda os tempos em que ingressou na atividade. Na primeira vez em que saiu para o mar com o pai, ele tinha 9 anos de idade. Desde então, não parou de pescar. Até pensou em seguir outra carreira, mas a necessidade de colocar comida na mesa e pagar as contas o fez se manter no ramo. Quando jovem, migrou para a pesca industrial, entre os 18 e os 25 anos, mas voltou para a pesca artesanal depois que casou. “Eu sou muito apegado à minha família e na pesca industrial é muita distância”, justifica a escolha.
Todos os dias, ele sai para o mar em busca do pescado. Tainha, corvina e anchova são as principais espécies capturadas. Apesar de hoje existir maior facilidade para revender o pescado do que quando iniciou na atividade, Amarildo, assim como outros pescadores artesanais, reconhece a dificuldade de encontrar o peixe no mar.
A extencionista social e pesca da Epagri, Tânia Mendes Nunes, explica que são raros os pescadores que conseguem ter só a pesca como principal fonte de renda. "Os estoques diminuíram e a frota aumentou. Antigamente, se tinha menos embarcações com mais estoque do pescado", destaca. Tânia ressalta ainda outro entrave gerado pelo desenvolvimento da cidade. "O turismo compete com o pescador artesanal, no espaço da praia. Muitas comunidades não têm um rancho para puxar seu barco, fazer uma manutenção. E no período de veraneio quando a praia fica acirrada, o pescador é marginalizado, ele não pode ficar na praia, tem que tirar o barco. Há também um conflito com a parte imobiliária. Com o tempo o pescador está se rendendo a este progresso. Ele está numa faixa muito estreita, aí não consegue progredir", sentencia.
Por causa desse e de outros motivos, Aldori Aldo de Souza, de 45 anos, incentiva o filho de 19 anos a seguir outra profissão. “A pesca artesanal está muito fraca. O pescador artesanal não compensa mais viver com a pesca. Tudo é muito caro: o óleo vai para R$ 2,40, a rede é cara, a manutenção da rede é cara. Na pesca tem mês que você ganha e tem mês que você não ganha”, desabafa o pescador que mora com a família no Pântano do Sul, região onde cresceu e se estabeleceu.
Assim como tantos outros pescadores, aprendeu o ofício com o pai que hoje tem 72. Por um tempo também se arriscou na pesca industrial, mas a distância e as longas jornadas o fizeram retornar para terra firme. Hoje, toda a família vive em função da pesca. A mulher ajuda na limpeza do pescado quando o filho, que estuda curso técnico em uma instituição federal, sai para o mar, nos dias em que é solicitado.
Empreendedorismo na pesca
Para sobreviver na atividade, alguns pescadores passaram a buscar fontes alternativas de trabalho. As pequenas embarcações ganharam maior capacidade de armazenamento e a atividade quase solitária passou a ser feita de forma cooperada. Valdemiro Lamiro Vieira, conhecido como seu Veco, é pai de sete filhos, quatro homens. Destes, três continuaram na atividade como pescadores artesanais.
O trabalho conjunto da família tornou possível a ampliação da frota. Hoje, eles possuem três embarcações, uma delas com capacidade para transportar 20 mil toneladas, capaz de ficar até 15 dias no mar. Os barcos são operados por seu Veco, dois filhos, dois netos e alguns funcionários contratados. Silvano é quem administra o trabalho e fica responsável em investir no desenvolvimento da atividade. “Eu tenho a confiança deles, porque sou o mais rápido nestas questões e, graças a Deus dá certo”, fala enquanto apresenta um rebocador produzido pela família.
Silvano começou a pescar aos 11 anos de idade. Estudou até a quarta série e diz que sua faculdade foi o mar. “Não dizem que advogado tem que estudar para ser doutor? Na pesca é igual, a gente precisa da prática para aprender e se desenvolver. Por isso, quando dizem que pescador não teve chance de estudar isso nem sempre é verdade, ele optou em aprender o trabalho no mar”, declara Silvano.
Seu Veco concorda e diz que só vai parar, quando não tiver mais forças. Ele está nesta atividade há 52 anos e fala com muita alegria dos projetos para o futuro na pesca da família. “Eu nunca tive outra profissão. Me aposentei ano passado com salário e continuo pescando. Eu sempre mantenho esta parte. Sempre quis adquirir esta parte, tocar meu negócio, ser independente”, finaliza o pescador, que destaca a liberdade de mandar no próprio caminho e não depender de patrão, como um dos principais atributos da pesca artesanal.
(Do GI - http://g1.globo.com/sc/santa-catarina)
Nenhum comentário:
Postar um comentário