quarta-feira, 27 de junho de 2018

COMO TURISTAS, ELAS ESTÃO CHEGANDO...

"Como turistas que chegam no verão elas sempre aparecem no inverno. Não é de hoje, há muitos anos que elas aparecem por aqui. Por isso foram construídas “armações” para pescá-las e beneficiá-las, uma atividade econômica muito importante naquela época.

Em Santa Catarina foram fundadas as armações de Sant’Anna da Lagoinha, na ilha, São João Batista do Itapicorói, Nossa Senhora da Piedade, São Joaquim de Garopaba e seu prolongamento lá na Imbituba, a última da costa brasileira.

A Campanha Baleeira era o termo que se usava para a época da caça que tinha início em 13 de junho, dia de Santo Antônio, e seu encerramento se fazia em outubro ou novembro.

As canoas baleeiras, construídas aqui pelos açorianos, eram as embarcações próprias para esta faina, pois já se usava lá nos Açores em larga escala. Inspiradas nas antigas canoas baleeiras americanas, foram adaptadas ao mar açoriano e depois catarinense.

Em meados do Século XVIII só na Armação da Ilha de Santa Catarina, Sant’Anna da Lagoinha, foram capturadas em média duzentas baleias por ano.

O óleo era destinado a Portugal e as outras áreas da Colônia para as luzes dos engenhos, das casas e fortalezas. Para saboarias, curtumes ou estaleiros e usado também nas construções para dar liga na massa, no traço. Fundia-se a banha que se apurava o óleo, salgava-se a carne para alimento. A língua, considerada fina iguaria, reservavam-na ao clero e a nobreza. As barbatanas eram destinadas as indumentárias femininas e masculinas, para armação do vestiário: saias, mangas, golas, chapéus, coletes e espartilhos e para fabricação de penachos de capacetes. Os ossos serviam para material de construção, para fabricação de móveis e outros objetos como pentes, botões, agulhas para redes, etc.

Os vigias ficavam em seus postos a espera das baleias. Quando avistavam faziam o sinal, causando grande saragaço na vila. Os baleeiros corriam para o mar e traziam a baleia rebocada para a praia. A comunidade corria para ver o “espetáculo”, era grande o rebuliço.
Surgiam os famosos pasquins, que nada mais era do que a forma irônica ou engraçada que alguém escrevia sobre o acontecimento. Depois de escrito era largado em algum lugar público onde todos pudessem ler. Causava grande confusão, mas ninguém sabia quem escrevia, embora muitos desconfiassem.
Assim ficava o dito pelo não dito. Alguns trechos de pasquins ainda são lembrados: 

“A baleia tinha craca, também tinha sururu, a quem não repara nada, margarida mostra o cu”. “Dona Jucelina, sua perna de garrancho, ela saiu daqui para o Adão beijar no rancho”. 
“As mocinhas da cidade também foram ver a baleia, caíram um tombo na praia, encheram a pomba de areia”.

Com o fim da pesca das baleias as canoas baleeiras, ou lanchas como também chamavam, passaram a ser usadas para todo o tipo de pesca.
Mas as baleias continuaram a nos visitar, agora sem perigo de serem mortas, pois não há mais razão para tal. Cimento, luz elétrica, roupas, não precisam mais serem extraídas das baleias, graças a Deus. 
As “armações” ficaram na memória, no passado. Mas os pescadores que agora pescam outros peixes no mesmo mar continuam sendo heróis sem nome, com o mesmo pé na terra e outro no mar, como seus antepassados. Com o mesmo medo, mas convivendo no mesmo espaço e respeitando o grande mamífero que um dia já foi sua presa."

(Arante José Monteiro Filho, o Arantinho, do Pântano do Sul, é pescador de tainhas, historiador e um dos proprietários do tradicional "Bar do Arante".)

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